
Por Pedro Andrade, Recife-PE, 2025.
Década de 80 no Brasil, tudo acontecendo ao mesmo tempo. Ditadura caindo, democracia ressurgindo e uma vontade retumbante de viver seus próprios sonhos corria nas veias daquela juventude. Rio de Janeiro, São Paulo e Brasília eram grandes epicentros de tudo o que viria acontecer. Naquela década havia espaço para o novo, para o diverso, para o inusitado, para o criativo, para o estranho. Aliás, quanta gente estranha! Em meio aquele turbilhão de novidades, a liberdade criativa explodia nos teatros, nas TV´s, nas artes e sobretudo na música. A música jovem agora tinha lugar de fala, não mais dependia do banquinho e do violão dos pais e avós pra se apresentar em público, artistas e público faziam parte da mesma turma, da turma que queria e gostava de fazer por ela mesma, que assumia a sua própria identidade, que apesar de inspirada em muitas outras não era igual a nenhuma outra.
Em meio a dezenas (num robusto plural) de bandas, em 1985 surgia no Rio de Janeiro o Biquini Cavadão. Um grupo de amigos cuja aparência e estilo de vida estava muitíssimo distante da imagem de ídolos do pop rock. Eram caras magrelos, com jeito e cara de nerd, que haviam decidido levar adiante seu desejo de ter uma banda. Tímidos, meio desajeitados, inseguros, mas com um sonho comum aquela geração, o de voar em busca do seu destino. Herbert Vianna sugeriu o nome definitivo e os Hipopótamos de Kart (um dos primeiros nomes propostos para a banda) acabaram aceitando e vestiram o Biquini Cavadão para a vida. Poderiam ter como nome Divisões Eletrotécnicas, mas o Biquini tinha a medida certa. Ufa! A Fluminense FM foi fundamental na divulgação do trabalho, deu oportunidade aos novos artistas de se ouvirem tocando no rádio e de sonhar mais alto, mas tudo ainda era muito indefinido. Era só o início. O contrato com a gravadora veio, o sucesso também. Até quando duraria aquilo? Um verão ou dois? Não tinham resposta. No dia 15 de março de 2025, 40 anos depois, estavam no palco do Circo Voador, um berço sagrado do rock nacional e diante de uma plateia de fãs vindos dos 4 cantos do Brasil para assistir seu show e presenciar a história acontecendo ali, ao vivo.
Quando Vento Ventania explodiu no Brasil, tenho a nítida lembrança de cantarolar a música nas tardes que passava na casa da minha avó materna, mas até aí era só uma criança que achava a música animada. A ideia de sair voando por aí levado pelo vento para os quatro cantos do mundo era muito boa, um prato cheio para um menino criativo e leitor da coleção Vaga Lume. Anos depois, por volta de 1997, voltando da escola, entrei em uma banca de revistas do meu bairro e me deparei com a coleção Pop Rock Nacional MTV e Revista Caras. Era uma revista que trazia na embalagem um CD. O Biquini fazia parte do volume 1, junto com outros artistas. A faixa era Chove Chuva. Eu tinha algum dinheiro guardado em casa e voltei até a banca pra buscar a revista/CD. O destino estava traçado e a partir daquele momento o Biquini seria a minha banda preferida. Quando meus pais não estavam em casa e meu irmão estava na escola era hora de botar o CD pra tocar e automaticamente me transformar em um mini Bruno de 13 anos de idade. O controle remoto do som era o microfone e os móveis à minha frente eram o público. Eu não sabia porque Topo Gigio e Auiba estavam ali na música, anos depois descobri. Coisas do Biquini.
Em 1998 veio Janaína como hit definitivo da banda e anos depois o Escuta Aqui, na minha humilde opinião de fã, o melhor disco de estúdio do Biquini. Vieram em seguida outros discos e momentos emblemáticos, o repertório do 80 (Disco de versões) foi muito importante porque possibilitou ao Biquini receber o olhar simpático de fãs de outras bandas do rock nacional. O primeiro DVD da banda, gravado em Fortaleza, foi outro marco vital para a história do Biquini. O registro dessa apresentação, com o público de um grande festival, apaixonado e cantando todas as músicas, mostrou para o Brasil a potência de uma banda já com seus 20 anos de existência, mas com inovação e o vigor de uma banda atualíssima. Quem já foi em um show do Biquini há de concordar que você pode até não gostar da banda, mas você vai respeitar o show que eles entregam. Isso é fato. Em 2008 gravaram um novo DVD, dessa vez no Circo Voador, o 80 Volume 2, com novas versões para músicas surgidas naquela década. Em 2014 mais um registro ao vivo foi feito, o DVD Me Leve Sem Destino, gravado em Goiânia.Outros trabalhos vieram depois, o disco Só quem Sonha Acordado Vê o Sol Nascer – Um ótimo álbum de inéditas. Roda Gigante – Com música indicada ao Grammy Latino. As Voltas que o Mundo Dá – Um mergulho alto astral e reflexivo sobre as nuances da vida. Ilustre Guerreiro – Uma homenagem sincera ao amigo e incentivador Herbert Vianna. Através dos Tempos – um passeio pela vivência dos integrantes. A banda lançou ainda um álbum chamado 12 de junho, com novas versões para clássicos românticos da banda e vem lançando outras canções de forma intercalada nas plataformas digitais.
O Biquini é uma banda surgida nos anos 80 mas que ao longo dos anos provou e continua provando que é um organismo vivo, pulsante e disposto a fazer novas coisas. É uma banda que, de certo, tem muito orgulho de sua história, mas que nunca deixou de orientar seus esforços para melhorar o próximo show, a próxima canção, o próximo disco. É uma banda que entendeu muito cedo que só conseguiria construir um caminho longevo se conseguisse, além de fazer boas canções, manter a amizade e o respeito entre os integrantes, o profissionalismo e o respeito perante as estruturas do show business como veículos de comunicação, gravadoras, contratantes e a gratidão e o respeito aos fãs, a grande sustentação da obra de todo artista. Observe que a palavra respeito esteve em todas as esferas citadas e isso traduz muito bem a relação do Biquini com tudo que cerca a banda.Em 2025, 40 anos depois, o Biquini (Cavadão) é uma banda que continua surpreendendo positivamente o público, entrega verdade nos shows, música boa sem apelo, sem se render a modismos e principalmente sem perder sua essência. No decorrer da sua jornada o Biquini soube construir pontes, interligar passado, presente e futuro, ter paciência nos momentos de crise e humildade nos momentos de alta. Hoje a banda navega um mar flat, com uma agenda sempre bem requisitada e apresentações poderosas. Bruno, Coelho, Miguel, Birita, Magal e Walmer são como um time que sabe que o jogo nunca está ganho, que apesar do placar favorável e do entrosamento de muitos anos, não existe lugar para salto alto ou guarda baixa, o jogo é jogado dentro de campo e isso eles fazem com grande maestria.Quem foi que disse que a vida começa aos 40? A vida começa agora! Vida longa ao Biquini e como diria o Bruno: Viva o Rock Nacional.