Direção: Paul Greengrass
Elenco: Matthew McConaughey, America Ferrera, Levi McConaughey e Kay McConaughey
Disponível em: Apple TV+

Quando Paul Greengrass decide revisitar uma tragédia real, já sabemos que vem aí uma experiência cinematográfica marcada por realismo e intensidade. Em O Ônibus Perdido, o diretor — conhecido por obras como Voo United 93 e Capitão Phillips — transporta o espectador para o coração de um desastre sem recorrer ao espetáculo vazio: aqui, o terror nasce do que é palpável, humano e urgente. Inspirado no incêndio Camp Fire de 2018, na Califórnia, o longa transforma um ato de coragem em narrativa cinematográfica de fôlego e emoção.

Desde os primeiros minutos, a direção investe em um estilo de câmera realista e dinâmico — característica marcante de Greengrass — que nos insere dentro do ônibus escolar cercado por fogo, fumaça e incerteza. A montagem ágil e a fotografia abafada criam uma atmosfera sufocante, ampliando o impacto de cada curva, cada respiração e cada decisão tomada em meio ao caos.

O roteiro — assinado pelo próprio diretor ao lado de Brad Ingelsby — evita o didatismo e mergulha direto no olho do furacão, focando no desespero coletivo, mas também nos silêncios individuais. Não há vilões caricatos, apenas pessoas tentando sobreviver. A trilha sonora, minimalista e tensa, atua como uma extensão das emoções dos personagens, reforçando o clima de urgência.

Matthew McConaughey entrega aqui uma das atuações mais contidas e intensas de sua carreira recente. Como Kevin McKay — motorista escolar há apenas um mês —, ele personifica a coragem involuntária, aquela que nasce não de heroísmo pré-fabricado, mas da necessidade de proteger vidas. Sua performance é reforçada pela presença real de seus familiares no elenco: seu filho, Levi McConaughey, e sua mãe, Kay McConaughey, interpretam respectivamente o filho e a mãe do personagem — escolha que adiciona autenticidade emocional à trama.

America Ferrera, como Mary Ludwig, a professora que auxilia no resgate de 22 crianças, é o contraponto de sensibilidade e racionalidade. Mesmo com menos espaço que McConaughey, sua atuação dá alma à narrativa, reforçando a importância da coletividade diante do colapso.

Apesar de ser promovido como um thriller de catástrofe, O Ônibus Perdido foge de muitos clichês do gênero. Ao invés de priorizar o espetáculo visual, a trama concentra-se na dimensão humana: sofrimento, solidariedade e o poder das pequenas ações diante do incontrolável. Essa escolha narrativa não só diferencia o filme de outros títulos sobre desastres naturais, como também amplia seu alcance emocional e social.

Há ainda um subtexto forte sobre negligência estrutural — como falhas em infraestrutura e resposta emergencial —, mesmo que o filme não se aprofunde totalmente nessas discussões. Essa camada, ainda que sutil, contribui para inserir a obra em debates contemporâneos sobre mudanças climáticas e responsabilidade pública.

Com pouco mais de duas horas de duração e classificação indicativa para maiores de 14 anos, o longa se tornou rapidamente um dos títulos mais comentados do catálogo da Apple TV+. E com razão: Greengrass alia técnica, emoção e ritmo para criar uma experiência cinematográfica intensa.

Alguns críticos lamentam que a obra não tenha estreado amplamente nos cinemas — de fato, seu domínio técnico e a imersão sonora tornam O Ônibus Perdido um filme que mereceria a tela grande. Ainda assim, sua chegada direta ao streaming facilita o alcance e transforma o longa em um poderoso convite ao debate sobre prevenção de desastres, coragem coletiva e o impacto humano por trás das manchetes.

O Ônibus Perdido é mais do que um relato de sobrevivência — é um lembrete visceral de que, diante do fogo, o heroísmo pode ser silencioso, coletivo e profundamente humano. Paul Greengrass reafirma seu talento em transformar tragédias reais em cinema de impacto, enquanto Matthew McConaughey entrega uma performance de intensidade emocional rara.

O filme pode não reinventar o gênero de desastres, mas encontra sua força na autenticidade, na humanidade e na urgência de sua mensagem. É uma obra que se assiste com o coração apertado — e que permanece com o espectador depois dos créditos.

Veredito: intenso, humano, necessário e uma experiência agoniante em vários momentos, enfim, um dos dramas mais impactantes do streaming em 2025.

📌 Curiosidades rápidas:

  • Baseado no incêndio real Camp Fire (2018), que devastou Paradise, Califórnia.
  • Kevin McKay e Mary Ludwig, as pessoas reais que inspiraram a trama, foram aplaudidos de pé na première em Toronto.
  • O elenco inclui familiares reais de McConaughey, ampliando a carga emocional.
  • Produzido por Jason Blum e Jamie Lee Curtis.
  • O filme tem 2h de duração e classificação indicativa de 14 anos.