Contos de Água e Fogo (2010), o último álbum do Nenhum de Nós, é o retrato de uma banda, desta vez fotografada com um tema e sofisticação. Uma das particularidades do rock gaúcho é se ater as suas cores, e este disco mantém essa característica. Deliberadamente, o grupo adotou nova sonoridade e arranjos rebuscados.

A composição desta vez encontra um ponto comum, cada uma das letras explicita, ou não, o amor e seus subgêneros. Mas cabe alertar que essa escolha em momento algum nos entrega um álbum cafona. Contos de Água e Fogo é um dos melhores discos do Nenhum de Nós.

O arranjo delicioso de guitarra abre o disco com “Corrente”, uma canção introspectiva de sentimentos conflitantes, com ótima bateria e valorização do belo vocal de Thedy. “Água e Fogo” em contraste a canção anterior, acelera um pouco o ritmo do álbum e trata da necessidade de seguir em frente.

“Último Beijo” é uma música deliciosa, e refrão inesquecível como um bom beijo. É a vez de “Primavera no Coração”, que entra para o hall de canções introspectivas, boas para colocamos no som e ficar pensando na vida.

“Outono Outubro” é sem dúvidas o petardo sonoro do álbum, escolha sábia como single. A executei em excesso no meu programa de rádio, e o feedback dos ouvintes sempre foi dos melhores. Uma canção com energia e uma boa letra. Afinal, estamos sempre em busca da felicidade.

Permeada por um belo arranjo de harmônica, banjo e bandolin, “Pequena” é a porção blues, folk e gauchês do Nenhum de Nós, traduzida em esperança. “Mistério Profundo” é a canção mais anos 80 desse álbum. O arranjo virtuoso soa despretensioso, e pelo contrário, essa despretensão é que nos entrega uma ótima canção.

Ao viajarmos no belo arranjo de cordas em “Exatamente Igual”, nos chama a atenção pelos detalhes da composição, que não ‘gruda’ no subconsciente, nota-se que ela abre a sequência de canções lados B do disco. Já “Melhor e Diferente”, digo assim, é diferente, o arranjo é uma viagem quase psicodélica e tem uma bela letra em parceria com o cantor e compositor Leoni.

“Início Fim” é outra com lindo arranjo de cordas. De tão densa, é a trilha sonora para momentos tristes e pensativos. Temos agora “Um Pouquinho”, uma bela música para cantar acompanhado de preferência pelo seu par, após aquelas briguinhas cotidianas. Com arranjo apoiado em um instrumento de cordas chamado ukelele, acho que posso dizer que o Nenhum de Nós criou um bolero folk.

João Vicente dá show com seu teclado e gaita em “Tu Vício”, cantada em espanhol, é um ótimo rock hermano. Se tivesse um ícone de curtir no disco, o clique estaria garantido. Thedy se garante muito bem nos vocais e pode bradar com propriedade o bordão a “La Garantia Soy Yo”. O álbum finaliza com “3000 léguas”, o lirismo a serviço da manutenção do momento romântico do CD.

Contos de Água e Fogo é um álbum paradoxal, composto com um cuidado imenso para os fãs do grupo e pronto para novos ouvintes. Ótimas canções que nos lembram indie, anos 80, rock inglês e rock gaúcho, mas o bom em seguida, é esquecer esses rótulos, mantendo somente a experiência de ouvi-lo com prazer.